Você já ouviu falar de Turismo de Base Comunitária? - Entrevista com Ana Gabriela Fontoura.
Apresentando uma nova e inclusiva forma de turismo, o Turismo de Base Comunitária tem ganhado cada vez mais espaço no Brasil. Embora pouco conhecido, é um dos roteiros mais solicitados por pessoas que queiram vivenciar experiências ambientais e culturais de comunidades tradicionais. Para que você conheça e entenda mais sobre, entrevistamos a Ana Gabriela Fontoura, turismóloga e diretora da operadora de Ecoturismo Estação Gabiraba, que atua na área a dez anos:
Foto: Rafael Araújo.
1. Ana Gabriela, o que é o turismo comunitário?
"Turismo comunitário é um modelo de gestão da atividade turística com foco na participação ativa e no protagonismo das comunidades locais. Elas são a raiz do turismo no espaço delas, atuando no planejamento, na proposição do roteiro ou empreendimento, na decisão sobre os custos e orçamento, na realização dos serviços e na avaliação das visitas. Ao contrário do que se pode pensar à primeira vista, turismo comunitário não é um segmento turístico, mas sim um modelo de negócio, ou seja, uma forma de fazer acontecer esta atividade visando à socialização dos benefícios gerados e ao fortalecimento das organizações comunitárias."
2. Você entende que o estado tem potencial para essa atividade?
"O Amapá tem uma enorme vocação para o turismo comunitário, pela diversidade de populações tradicionais e manifestações culturais, algumas de caráter único no Brasil, a exemplo do marabaixo. Além de ser o Estado que detém as menores taxas de desmatamento da Amazônia, com atrativos naturais e grande beleza cênica, demonstrando potencial específico para o ecoturismo. Essas potencialidades aliadas ao modelo de gestão comunitária constituem um cenário promissor ao desenvolvimento do turismo no Estado."
3. Quais são as principais vantagens para essa atividade ser desenvolvida no estado?
"Principais benefícios do turismo comunitário:
a) gera renda complementar para as famílias atuantes na atividade;
b) promove a valorização cultural e ambiental, por parte dos visitantes e dos próprios amapaenses;
c) fortalece a organização comunitária e o tecido social;
d) reforça o sentimento de pertencimento dos moradores em relação ao seu lugar;
e) reconhece e estimula as práticas e os modos de vida tradicionais; e
f) gera novas oportunidades de participação para mulheres e jovens nas comunidades."
Turismo de Base Comunitária. Foto: Ana Gabriela Fontoura
4. Quais as principais dificuldades para essa atividade ser desenvolvida no estado?
"Alguns dos desafios gerais à consolidação do turismo comunitário na Amazônia são:
a) o grau de dificuldade de acesso, devido à extensa dimensão geográfica da nossa região;
b) as altas tarifas de operação de serviços e de produtos, conhecidas como “custo Amazônia”, o que restringe o público (inclusive interno);
c) a oferta limitada de infraestrutura turística e de apoio nos municípios;
d) a escassez de mão de obra qualificada em turismo, incluindo o baixo grau de incentivo ao desenvolvimento de habilidades empreendedoras e de gestão de negócio localmente;
e) políticas públicas voltadas ao setor ainda são frágeis e encontram algumas dificuldades de implementação na região; e
f) conflitos e sentimento de não aceitação das Áreas Protegidas por parcelas da população.
Em adição a isso, destaca-se o fato do Amapá ser um destino novo, inédito enquanto produto na prateleira das principais agências e operadoras de turismo nacionais e internacionais. Esse fator exige um investimento maior em comunicação e promoção, visto que não é um destino conhecido do grande público e, por isso, apresenta uma demanda ainda pequena de visitantes."
5. Como isso fortalece a comunidade?
"O turismo comunitário tem o dom de fortalecer os laços, vínculos e as lideranças à medida que os moradores assumem o papel de protagonistas em seus espaços, dialogando e construindo coletivamente, com o poder de decisão e transformação partindo das comunidades. Sendo agentes do turismo em suas localidades – com todas as responsabilidades e realizações que o ato de empreender provoca – contribui para que os moradores passem a olhar suas realidades sob um novo prisma, com mais respeito, orgulho e estima. As relações sociais nas comunidades também se renovam, pois grupos que antes desenvolviam papéis secundários nas atividades produtivas locais, como as mulheres e os jovens, passam a ser inseridos e participar ativamente da geração de renda em suas famílias."
6. Qual a diferença para o turismo convencional?
"No turismo convencional, as viagens costumam envolver os moradores locais de forma mais superficial, com pouca abertura para negociações e proposições pelas comunidades. No momento de criar e praticar o orçamento há um desequilíbrio grande entre os valores repassados aos moradores que porventura prestam algum serviço e aqueles direcionados às empresas de turismo. Outro fator que se observa na nossa região, por exemplo, é que os atrativos naturais acabam sobrepondo-se aos atrativos histórico-culturais relacionados diretamente à existência das populações tradicionais e rurais, fazendo com que elas sejam “invisíveis” em vários roteiros – ou pior, descaracterizadas e/ou desrespeitadas."
7. Como isso fortalece áreas protegidas e modos de vida?
"O turismo de base comunitária relaciona-se diretamente às ações de educação ambiental e ao programa de Uso Público nas Áreas Protegidas, ampliando a sensibilização da população local e dos turistas quanto à importância da conservação. Além disso, pode oferecer alternativas econômicas aos moradores do interior e entorno das Áreas Protegidas, inclusive, àqueles que estão envolvidos atualmente com atividades extrativistas ilegais."
8. Ana, o que falta para o turismo de base comunitária crescer?
"A grande dificuldade nessa área tem sido a comercialização e o acesso ao mercado. Seria ótimo que mais agências e operadoras de turismo se dedicassem à venda de produtos turísticos nesse formato. Ao mesmo tempo em que o Governo apoiasse as iniciativas com a criação de políticas públicas específicas voltadas ao turismo comunitário e ações estruturantes e de promoção desse modelo de turismo."
"COMUNIDADE, para mim, quer dizer COM HUMANIDADE!" (Sr. Dázio, agricultor maranhense).
Agora que você já conhece o Turismo de Base Comunitária, que tal conhecer ambientes e culturas, fortalecendo as comunidades tradicionais locais?
Ana Gabriela Fontoura é natural de Belém (PA), turismóloga, graduada pela Universidade Federal do Pará - UFPA, e especialista em Estudos Ambientais pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais - PUC. Possui mais de treze anos de experiência na área de ecoturismo e uso público em Áreas Protegidas na Amazônia. Em 2007, fundou e desde então é diretora da Estação Gabiraba, uma operadora de ecoturismo de base comunitária que atua em parceria com populações tradicionais e organizações locais na região amazônica. Atua também como consultora para organizações socioambientais. E-mail para contato: gabi@estacaogabiraba.com.br.